quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Velha questão: atendimento brasileiro.

Acabo de voltar de uma doceria bastante conceituada aqui em Londrina, e voltei com alguns pensamentos.

Não aconteceu nada de extraordinário: pedi um doce e um expresso, dei uma olhada no jornal local e me dirigi ao caixa. A senhora que cuidava do caixa fez uma rápida conta, me disse o valor, processou a compra na maquininha e me devolveu o cartão. Enquanto fazia essas operações básicas, não expressou qualquer tipo de gratidão ou empatia; se limitou a dizer um "obrigado" quase inaudível, de tão discreto.

O que há de errado nisso? No Brasil, nada. É tão normal que, quem nunca leu meus posts anteriores sobre atendimento a clientes no Japão, pode não entender a razão de eu comentar algo tão corriqueiro.

Eis o porquê: a senhora do caixa era nikkei, assim como os donos do estabelecimento. Se não fosse, é bem provável que eu não estaria digitando este post, pois não passaria de mais um atendimento "sem sal" que eu teria recebido ao longo da minha vida.

"Mas e daí que ela era nikkei?", alguns podem pensar. "Por acaso o fato dela ser nikkei a obriga a ser simpática com os clientes?". Não, não é isso. Na verdade, sendo nikkei ou não, ela teria sim obrigação de oferecer um atendimento ao menos agradável, condizente com a reputação que seus salgados e - principalmente - doces têm entre os consumidores londrinenses.

Pensamentos utópicos à parte, confesso que, inconscientemente, criei uma pequena expectativa em relação ao atendimento no caixa, justamente por ser uma senhora nikkei. Não que eu esperasse toda a formalidade e educação nipônica (vale lembrar que, quando digo nipônico, me refiro aos nativos, não aos descendentes), mas no mínimo um sorriso, ou algo que demonstrasse sua gratidão (ou será que ela não estava nem um pouco grata?).

Se for pensar, quase sempre acabo fazendo isso: se vou ser atendido por um(a) nikkei, seja em qualquer situação, automaticamente suponho que vai haver uma espécie de "identificação natural" nessa breve relação em que sou cliente. Totalmente natural, da mesma maneira que quando duas pessoas de mesma nacionalidade, que não se conhecem, se esbarram em um país estrangeiro, costumam ter um tipo de "conversa de elevador".

No caso que envolve dois nikkeis, é fácil entender (imagino que os nikkeis que esteja lendo entendam perfeitamente o que quero dizer): muito provavelmente ambos cultivam os mesmos hábitos tradicionais, suas famílias passaram por situações semelhantes no passado, tiveram uma educação baseada nos mesmos princípios etc. (não que isso seja exclusivo à colônia japonesa!).

Mas não quero dizer que, por causa disso, os nikkeis merecem ser tratados de maneira diferenciada, claro que não; até porque, como disse antes, cliente é cliente e deve sempre ser tratado bem, sem discriminação. Talvez este seja o "x" da questão: não existe um padrão de atendimento brasileiro. Você não sabe o que esperar da pessoa que, teoricamente, deveria ser educada, cordial e - por que não? - simpática. Ainda que a lógica "quanto mais caro o serviço, melhor o atendimento" exista, não são raras as ocasiões em que somos surpreendidos por um funcionário carrancudo ou por uma funcionária displicente.

O problema é que, de tão acostumados que os brasileiros somos com atendimento ruim (lê-se: demorado, antipático, ineficiente etc.), não damos a devida importância a esse assunto. Aquilo que é considerado normal aqui no Brasil seria totalmente inaceitável no Japão, mas quantos param para pensar a respeito? Sempre acabo comparando com o atendimento japonês porque é o que eu conheço; infelizmente nunca estive em países escandinavos, por exemplo, mas sei que o Japão é reconhecidamente um dos países que mais dão valor à maneira como tratam as pessoas, seja no comércio ou mesmo fora dele.

Curiosamente, essa característica brasileira, de não investir em treinamento dos funcionários na questão do atendimento, abre oportunidades de diferenciação no mercado. É até um tanto quanto óbvio (pelo menos para mim) que uma empresa que ofereça um nível de atendimento excepcional se destaca daquelas que não passam de ordinárias, mas a impressão que tenho é que pouquíssimas organizações brasileiras compartilham esse ponto de vista.

Eu, particularmente, nunca pensei seriamente em abrir um negócio, mas se algum dia tiver essa oportunidade, a qualidade do atendimento ao cliente terá prioridade máxima. É utópico querer implantar um "modelo de atendimento japonês" no Brasil, mas por que não fazer um pouco de esforço para que o cliente tenha uma experiência no mínimo agradável?

13 comentários:

Rodrigo Tancsik disse...

Senpai,esse seu texto me fez lembrar uma parte do livro Corações Sujos ,do Fernando Morais,um trecho em que diz,que aos poucos,os japoneses começaram a se introduzir nos modos brasileiros.Realmente,se introduziram de corpo e alma.Não que todos os brasileiros são antipaticos,mas a boa maioria são,e sem distinção,nikkei,alemão,italiano ou africano,o que for.

ariel disse...

ゼッタイに本当だぜ!
ブラジルではその小さな事は構わないけど、全て構いが小さなことから始まるよ。

ポストありがとうなぁ!

Claudio disse...

Isso me lembra de um posto de gasolina aqui em São Paulo. Ele fica em uma avenida grande, então o preço da gasolina é pouca coisa mais caro que em outros postos, mas eu abasteço nele sempre que posso, justamente por causa do atendimento.

Sempre que estaciono o carro ao lado das bombas é o mesmo ritual: peço para abastecer e entrego a chave. Enquanto isso, o frentista levanta o limpador de para-brisa e dá uma limpada no para-brisa.

Então, quando termina o abastecimento, ele me pergunta se vou pagar com cartão e (assim que confirmo) diz que eu não preciso descer do carro que ele vai buscar a maquininha de cartão. Assim que pago, ele me pergunta em que direção vou seguir, e caso diga que vou seguir adiante, ele vai até a beirada da rua, faz sinal para os carros que estão passando para me darem uma trégua, para que eu possa voltar com o carro para a rua. E claro, nem preciso dizer que sempre se despede com "boa noite" e "tchau".

É simplesmente sensacional esse tipo de atendimento, ainda mais comparado com a maioria dos outros postos em que o frentista nem sabe ouvir direito o que você pede, ou te atende super apressado.

E isso que nem precisava ser tão cordial da maneira como esse posto atende. Gestos menores do que esses, demonstração de preocupação com o bom atendimento do cliente já o deixariam satisfeito eu imagino (eu ficaria)!

Aru disse...

Concordo com você. Merchandising à parte, as livrarias Saraiva tem um atendimento ótimo (pelo menos a mega store do centro do RJ). Tão bom que eu me sinto obrigado a dar prioridade quando penso em comprar alguma coisa, se lá não tem, aí eu vejo em outra loja.

Marcus disse...

Se dependesse de mim, atendentes nunca estariam certos, então nem exijo muito deles, hahahaha :-P

Deixa eu explicar. É que às vezes eu quero um atendimento mais atencioso, outras vezes eu realmente quero um atendimento mais mecânico mesmo, que deixe eu olhar as coisas e só atenda se for chamado. E os coitados dos atendentes não têm como adivinhar...

Só peço que seja um atendimento eficiente, e quando eu pedir atenção, que eu obtenha. E que não seja com aquelas falas decoradas de telemarketing.

Junia disse...

Oi Gabriel!!
Muito interessante o seu post! Mas eu acho o seguinte: quando sou mal atendida, nem volto no lugar. Se o povo não faz nada, ou seja, continua indo em um lugar ruim e acatando gente mal educada, aí que ele não vai melhorar mesmo.
Abraços

Kiyomi disse...

Gabriel, realmente atendimento faz diferença. Mesmo aqui, passei por maus bocados, acredite: em imobiliárias! Pode achar estranho, mas em duas imobiliárias que fui (muito tempo atrás), uma foi bem curta e grossa - "Não alugamos para estrangeiros!" e na segunda, enrolou-me para dizer "bem, não sei se poderemos atender estrangeiros". Você que me conheceu, muita gente acha que sou japonesa... até a hora de abrir a boca.
Tirando esses incidentes (além da imobiliária atual ter-nos negligenciado ajuda para resolver o caso dos pneus furados por pura safadice), fui bem atendida.
Quando tirei um mês de férias, senti a diferença. Na loja de roupas, acompanhando minha mãe, a atendente de um em um minuto ficava me seguindo perguntando se eu queria comprar algo. Mas na livraria fui muito bem atendida, a vendedora até passava receita culinária no meio da conversa!!!
Verdade seja dita: onde tem-se bom atendimento, voltamos quantas vezes quiser, pois isso não tem preço!
Abraços!
PS.: Guarde as energias pro show do Sir Paul...

Luma Perrete disse...

Pra mim bom atendimento é uma coisa essencial. Se for mal atendida em um estabelecimento, dificilmente voltarei.
Mas também não gosto de atenção demais, principalmente em lojas. Eu gosto de ficar à vontade e ter alguém para me atender caso precise. tem uma loja aqui que eu gosto, mas só entro nela quando é necessário, porque é você colocar o pé na loja e fica uma atendente te seguindo. Não gosto disso. Acho que ela deveria somente se prontificar e ficar à disposição, não me tratar como se eu não soubesse o que quero.

Também percebo uma diferença cultural entre Aracaju e o Rio, que foram as cidades onde eu já morei. Aqui em Aracaju as pessoas são mais fechadas, então o atendimento nos lugares costuma ser mais sério (o que não quer dizer que seja antipático). Já no Rio as pessoas são mais abertas e isso também reflete no atendimento. Confesso que depois de morar tanto tempo longe, eu meio que estranho o excesso de simpatia e às vezes até de intimidade com que os atendentes costumam tratar as pessoas no Rio.

Na minha experiência nos Estados Unidos, nunca tive problema com atendimento, mas já vi vários americanos reclamando do atendimento lá. Acho que como turista não dá pra avaliar muito, já que as pessoas costumam tratar especialmente bem quem é de fora.

Unknown disse...

quando voltei do japao senti uma diferença enorme principalmente no mercado eles pegam suas coisas e vai jogando o resto nem precisa falar .
gabriel o nihongo de okinawa e hokkaido é muito diferente vç conheçe
o dialeto,,,

Mariana. disse...

Eu concordo muito com seu pensamento. Sou nikkei e entendi perfeitamente. Eu sou muito adepta ao bom atendimento, assim que passei por algo semelhante em uma casa de frozen iogurte, e um restaurante, onde ambos as atendentes do caixa eram descendentes (ambos também no bairro Liberdade de SP), e nem olham no seu rosto, sorriso? Isso existe? É complicado!
Aí vc pensa, será que tiveram um bom treinamento para lidar com o público? Mas no fundo, isso depende mais da pessoa do que ao fato de "colocar a camisa" da empresa para vender...

Fabio tikao disse...

Desculpe caro amigo, mas vivo a 13 anos no japão e já vivi os três lados da moeda.sim moedas tem três lados e não dois.
Já fui mal atendido no Brasil,bem atendido no Brasil e mal atendido no Japão.Eu por minha mãe ser Brasileira não tenho nenhuma aparência nipônica e as vezes quando não se tem aparência oriental ou nórdica se é tratado mal mesmo no Japão.
Quantas vezes na Cidade de Nagoya fui barrado na portaria de Bares e casas noturnas e me falavam grossa GAIKOKUJIN DAME DAZOO!!
E mesmo em supermercados se vê a diferença a se tratar um oriental, algum extrangeiro de pele branca,olhos e cabelos claros. E se tratar um Extrangeiro de cor escura como eu quero.`Pergunte a Filipinos,Indianos,Indonesianos e Latinos se aumentos uma vez não teve tratamento rude ou diferente no Japão.

Anônimo disse...

Eu as vezes trabalho na loja do meu tio, e fico até surpresa que alguns clientes estranhem eu sorrir e dizer obrigado.

As pessoas estão tão acostumadas com um serviço rude e indiferente que estranham o certo...

Anônimo disse...

Esse post me levou a refletir sobre alguns fatos, embora eu sempre pense no motivo que me leva a escolher certas lojas aqui no Japão.
Pode parecer engraçado, mas aqui também tem uma diferença enorme no atendimento, talvez quem não entenda muito o nihongo passe despercebido, mas para quem já esta um pouco mais habituado com os japoneses logo percebe.
Quando fui comprar móveis e eletro para minha casa, fiz várias pesquisas, em diversas lojas de grande porte.Em uma a atendente simplesmente se limitou a dar informações sobre o produto e o valor de compra, sem se preocupar em de fato conquistar um cliente.
Na outra, além dos fatores acima, o atendente foi mais esperto, já que ganhava por comissão quiz logo negociar o preço com desconto, no intuito de me fazer comprar. Fiquei de pensar e então fui na terceira e uma das maiores lojas, lá tive o melhor atendimento, aliado a boa vontade e empenho de uma equipe, todos os atendentes que consultamos, foram igualmente gentis, fazendo com que me sentisse super bem e a vontade para negociar os produtos que queria.Além de cobrir o orçamento da concorrencia, ainda pude fazer minha oferta , a qual foi acatada imediatamente pelo vendedor. No final, sai carregada de brindes, cartões de pontos, gifts cards e tantos outros mimos. Depois de passar no caixa, o vendedor me esperava na porta para se despedir, agradecer e ainda parar o trânsito para que pudessemos sair tranquilos de carro.
Nunca mais fiz pesquisas, sempre vou na mesma loja e não me arrependo.