Acabo de voltar de uma doceria bastante conceituada aqui em Londrina, e voltei com alguns pensamentos.
Não aconteceu nada de extraordinário: pedi um doce e um expresso, dei uma olhada no jornal local e me dirigi ao caixa. A senhora que cuidava do caixa fez uma rápida conta, me disse o valor, processou a compra na maquininha e me devolveu o cartão. Enquanto fazia essas operações básicas, não expressou qualquer tipo de gratidão ou empatia; se limitou a dizer um "obrigado" quase
inaudível, de tão discreto.
O que há de errado nisso? No Brasil,
nada. É tão normal que, quem nunca leu meus posts anteriores sobre atendimento a clientes no Japão, pode não entender a razão de eu comentar algo tão corriqueiro.
Eis o porquê: a senhora do caixa era
nikkei, assim como os donos do estabelecimento. Se não fosse, é bem provável que eu não estaria digitando este post, pois não passaria de mais um atendimento "
sem sal" que eu teria recebido ao longo da minha vida.
"Mas e daí que ela era nikkei?", alguns podem pensar.
"Por acaso o fato dela ser nikkei a obriga a ser simpática com os clientes?". Não, não é isso. Na verdade, sendo nikkei ou não, ela teria sim
obrigação de oferecer um atendimento ao menos
agradável, condizente com a reputação que seus salgados e - principalmente - doces têm entre os consumidores londrinenses.
Pensamentos utópicos à parte, confesso que, inconscientemente, criei uma pequena expectativa em relação ao atendimento no caixa, justamente por ser uma senhora nikkei. Não que eu esperasse toda a
formalidade e
educação nipônica (vale lembrar que, quando digo nipônico, me refiro aos nativos, não aos descendentes), mas no mínimo um
sorriso, ou algo que demonstrasse sua
gratidão (ou será que ela não estava nem um pouco grata?).
Se for pensar, quase sempre acabo fazendo isso: se vou ser atendido por um(a) nikkei, seja em qualquer situação, automaticamente suponho que vai haver uma espécie de "
identificação natural" nessa breve relação em que sou cliente. Totalmente natural, da mesma maneira que quando duas pessoas de mesma nacionalidade, que não se conhecem, se esbarram em um país estrangeiro, costumam ter um tipo de "conversa de elevador".
No caso que envolve dois nikkeis, é fácil entender (imagino que os nikkeis que esteja lendo entendam
perfeitamente o que quero dizer): muito provavelmente ambos cultivam os mesmos hábitos tradicionais, suas famílias passaram por situações semelhantes no passado, tiveram uma educação baseada nos mesmos princípios etc. (não que isso seja exclusivo à colônia japonesa!).
Mas
não quero dizer que, por causa disso, os nikkeis merecem ser tratados de maneira diferenciada, claro que não; até porque, como disse antes, cliente é cliente e deve
sempre ser tratado bem, sem discriminação. Talvez este seja o "
x" da questão: não existe um
padrão de atendimento brasileiro. Você não sabe o que esperar da pessoa que, teoricamente, deveria ser educada, cordial e - por que não? - simpática. Ainda que a lógica "quanto mais caro o serviço, melhor o atendimento" exista, não são raras as ocasiões em que somos surpreendidos por um funcionário
carrancudo ou por uma funcionária
displicente.
O problema é que, de tão acostumados que os brasileiros somos com atendimento ruim (lê-se:
demorado,
antipático,
ineficiente etc.), não damos a devida importância a esse assunto. Aquilo que é considerado
normal aqui no Brasil seria totalmente
inaceitável no Japão, mas quantos param para pensar a respeito? Sempre acabo comparando com o atendimento japonês porque é o que eu conheço; infelizmente nunca estive em países escandinavos, por exemplo, mas sei que o Japão é reconhecidamente um dos países que
mais dão valor à maneira como tratam as pessoas, seja no comércio ou mesmo fora dele.
Curiosamente, essa característica brasileira, de não investir em treinamento dos funcionários na questão do atendimento, abre oportunidades de diferenciação no mercado. É até um tanto quanto
óbvio (pelo menos para mim) que uma empresa que ofereça um nível de atendimento
excepcional se destaca daquelas que não passam de ordinárias, mas a impressão que tenho é que
pouquíssimas organizações brasileiras compartilham esse ponto de vista.
Eu, particularmente, nunca pensei seriamente em abrir um negócio, mas se algum dia tiver essa oportunidade, a qualidade do atendimento ao cliente terá
prioridade máxima. É utópico querer implantar um "
modelo de atendimento japonês" no Brasil, mas por que não fazer um pouco de esforço para que o cliente tenha uma experiência no mínimo
agradável?